NÃO IDENTIFICADO

07/12/2014 13:43

 

 

POR ALANNA SOUTO

Por mais que não quisesse mais amá-la e que todos os fios de julgamentos condenassem esse amor por todo seus medos, escolhas desastrosas, seus ataques coléricos, por mentir em nome do sei lá o quê... Talvez mentisse em nome dos sangues paternos ou em nome de suas roupas velhas mal trajadas que nem mais lhe cabia, mas insistia em se apresentar a sociedade dantesca com essa carcomida armadura...aquele tipo de mentira não sincera originária do submundo mais sombrio das emoções, águas turbulentas e escuras, habitadas por animais aquáticos não envolvidos por escamas, mas cascas, como se fossem baratas cascudas que estavam ali para envolve-la e maculá-la, limitando sua reação em seu naufrágio...nosso naufrágio.

De repente, me vi náufraga junto contigo naquele mar de baratas cascudas e piranhas venenosas, não percebes o quanto a invídia nos quer dilacerados e afunde no mar das circunstâncias banhada nas águas dos equívocos?! Já basta os nossos próprios bichos que devemos enfrentar, não basta todos os nós que já conseguimos desatar? As ondas gigantes nos empurrava cada vez mais para longe da terra à vista...

Nesse mar nadei, mergulhei e me desviei de todos os monstros que lá estavam, vi o quanto estavas se entregando aquela corrente de línguas enfermas, maus olhados, vilanias endógenas e exogénas, o afogamento seria inevitável, mas lhe alcancei e carreguei seu corpo frágil, meio que desmaiada olhavas para mim atônita, perguntou-me se era Iemanjá ou algum ser divino, disse que não, esses deuses estão ocupados com questão maiores, e me apresentei: “sou eu, não lembras? Apenas eu, a Ângela, visito-te nas horas infernais e mesmo nos tempos suaves vou lá ver-te e conferir se estás bem, nos teus dias de sonhos até sorrir para mim. Bom, não importa isso agora, acalme-se...fique calada, já estamos chegando a beira”.

E chegamos...sentimos a areia em nossos corpos desidratados, deitamos na beirada da praia, adormeçamos por alguns instantes, acordamos com o vendedor de água mineral que passava por nós, cantando hits de algum lugar que não lembro, compramos várias garrafinhas e bebemos como se fosse antídotos de todos veneno que nos corroía, nosso soro antiofídico.

Ficamos horas em silêncio, de frente uma para outra, como se tivéssemos conversando com os olhos, algumas “milágrimas” escorriam em nosso semblante e lá eu me vi em cada desespero seu...me reconheci em seus devaneios e segredos, naquele momento recolhi as minhas pedras e lhe dei a total compaixão, deixei apenas as suas, afinal são suas rochas, apenas tu sabes a hora que deves quebra-las.

Caminhamos por horas, conversamos, falamos de banalidades, sobre como é gostoso andar descalço e sem tantas maquiagens. Sentimos por clarividência tudo aquilo que ficou para atrás, nossas mortes e renascimentos, a superação de uma força que nunca seca...

Andamos mais um pouco até o seu recinto, entramos, havia um sofá grande e confortável, sentamos, deitaste em meu colo, acariciei seus cabelos e em questão de segundos caíste num sono profundo.

O alarme do meu relógio tocou, devo ir, pensei, foi quando escrevi essa carta para lhe dizer que sempre estou aqui e por mais que se sinta só, algumas vezes duvidando do próprio sentido da existência e de quem tudo criou, independente de todas as dúvidas e apunhaladas, até mesmo aquelas vindas de suas próprias mãos, ainda sim, velo pela tua paz, cura e libertação do que quer lhe impeça e bule...inclusive a proteção de si, proteja-se de sua própria loucura, administre seu clube da luta, todos nós temos nossos ringues internos que devemos contornar.

Ah! Mas não nos conhecemos! Somos dois seres estranhos que se amam avidamente, ligados por uma paixão tempestiva antiga, desperta em alguma vida passada, talvez nos tempos da renascença em Florença na Itália, estudamos artes ocultas, trocamos nossos primeiros olhares e fizemos sexo por telepatia ou no dia em que nos beijamos pela primeira vez em sua carruagem em frente da Bastilha em Paris antes dela ruir em 1789...ou ainda naquele dia em que finalmente conseguimos derrubar o muro de Berlim em 1989...é meu amor, “tudo que é sólido desmancha no ar”...

Queria poder lhe dizer venha por aqui, segure minhas mãos, mas a Lei em que sigo, a nave que habito só transporta terráqueos que vem por iniciativa própria...despeço-me feliz em ver-te crescida, fortalecida e sonhando com as estrelas, longe de naufrágios e de bichos horrendos. Do “passado”, “presente” e “futuro”.

O céu que lhe deixo a ver nessa noite e nas muitas em que mirar o infinito intergaláctico é o objeto não identificado de tudo aquilo que vivemos sem temos nos “conhecidos”.

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