CANTO PARA OIÁ: EM TEMPOS DE TRANSFORMAÇÃO

04/12/2013 10:57

 

Alanna Souto

 Dezembro mês especial que marca o fim do ciclo anual, momento de finalizações para alguns, de recomeço, morte, vida e renascimento para outros.  Nada mais é como antes, mesmo para quem possa está se sentindo perdido ou estagnado o fim do ano nos cobra movimentação, corte de tudo aquilo que não nos serve mais em todos os âmbitos de nossas vidas, iniciativa para o novo ciclo, dependendo do tempo de cada um, pode ser tempo de plantar, alimentar ou colher.

O tempo toma, recolhe, exigi amadurecimento, assim como a fruta madura que cai da árvore pronta para ser degustada. Não se brinca com o tempo, ele pode ser muito severo para com quem vai à contramão de sua conduta que nada mais é que movimentação, esgotamento e libertação.

O ano de 2013 seguiu rigidamente a simbologia dos astros e dos orixás para esse ano regido por Saturno, planeta da rígida e austera transformação, e Obaluaê, orixá das almas e da “morte”.  Digo isso lembrando dos acontecimentos que ocorreram nesse ano no Brasil, manifestações que se espalharam em todo país, a juventude mais recolhida em seus “apartamentos” acorda diante dos despertos jovens das periferias que se mobilizaram em conjunto ante a estagnação do país em áreas básicas da cidadania: transporte, educação, saúde, etc. solicitando por mudanças imediatas. 

E a nível internacional, o trono norte-americano já se esfacelando cada vez mais na consolidação de governos progressistas da América Latina, a citar os chavistas da Venezuela, Mujica no Uruguai, Rafael Correa no Equador, Evo Morales na Bolivia, "os Kirchners" na Argentina e apesar das contradições de algumas pastas sociais, os governos de Lula e Dilma no Brasil entram no embate, todos se negando a seguir a o receituário fracassado das fórmulas neoliberais. O que virá daqui pra frente no vindouro ano dependerá muito mais da articulação e da cobrança dos movimentos sociais de base para que esses cumpram demandas não mais creditada dos grupos de direita, trata-se da grande massa da população que tem escolhido esses líderes para dirigirem suas nações, mesmo diante de cenários paradoxais e de conflitos existentes em seus governos, garantindo a provável continuidade desses governantes em eleições futuras e dizendo NÃO á velha forma de poder. Ou será já estão se tornando numa velha caduca prestes a morrer? Deixemos a resposta para Clio responder em seus passos futuros.

Diante desse quadro de rupturas e permanências seja no âmbito interno e/ou externo que pede por atitudes, iniciativas e posicionamentos estratégicos perante, em especial, as circunstâncias mais problemáticas a qual nos defrontamos é que podemos encontrar o arquétipo de Iansã, emanação divina que atua no trono feminino da LEI do Cosmo, do caos e da ordem. É a mais guerreira das Yabas (orixás femininas), atuando no sentido da justiça junto com Xangô e na lei com Ogum. Absorve ativamente o desequilíbrio na lei de forma ativa, reconduzindo o ser ao equilíbrio; cósmica, pune todos aqueles que se utilizam ou se aproveitam dessa qualidade divina com más intenções ou interferindo no livre arbítrio do próximo. Age, portanto, como fator direcionador, ajudando a encaminhar as pessoas, mostrando-lhe o caminho certo a seguir.

No sincretismo Iansã é relacionada a Sta. Barbara, a santa virgem que foi trancafiada numa torre para que não atraísse os pretendentes, acabando por questionar as deidades romanas por tal situação que estava passando, converteu-se ao cristianismo, sendo condenada, torturada e por fim foi degolada por seu próprio pai em a honra da fé a seus deuses e à ordem do prefeito da cidade. Nesse aspecto o fanatismo e a banalidade do mal já existente desde os tempos da antiguidade, reza a lenda que o pai foi atingido por um raio logo depois que decapitou a filha, desde então foi tida como santa, sendo invocada para proteção de raios e trovões. 

Coincidentemente Iansã é tida no panteão africano, bem como umbandista, como a deusa do raio, deixando pistas, quem sabe, sobre sua interferência de lei e de justiça diante do ocorrido á Barbara. Não á toa, os nossos ancestrais africanos elegeram Sta. Barbara como figura representativa dessa Yabá, que por ser orixá transcende o arquétipo da santa. É muito maior por ser universal, rica nos aspectos simbólicos e em seus diversos desdobramentos, assim como todos os outros orixás.

Iansã, elemento ar, é o único orixá presente em todos os reinos, assim como Ogum não tem reino específico, sendo ambos os orixás obrigatórios nas aberturas e fechamento de trabalhos espirituais.

Dentro da simbologia do Tarot, ela está muito relacionada ao naipe de espada, sendo o elemento ar ligado a mente e ao desenvolvimento intelectual, assim como Xangô, mas diferente deste que refreia o processo sendo mais conciliador, ela atua ativamente com seu raio, símbolo da justiça divina atuando no plano físico, iluminando-nos e nos confrontando com nosso sombrio ego e com sua espada é o instrumento da lei, que ampara e protege a todos, auxiliando, também, nos cortes de vícios e vicissitudes que desequilibram a caminhada da evolução.

Na cabalá podemos localizar Iançã, refletindo ainda na lógica do simbolismo de forma geral, na estrutura da árvore da vida a partir do sefirah Hokmah, esfera da árvore relacionada à sabedoria. Obviamente que estou aqui aventando uma relação, mesmo porque essa relação Orixás x Árvore da vida merece um estudo mais profundo. E apesar de Hokmah ser tradicionalmente descrita como masculino, observa Viviane Crowley, na bíblia a sabedoria é descrita como feminina, além de que as ideias sobre esse sefirah são influenciadas também pelas filosofias do gnosticismo grego sobre Sofia, a Deusa da sabedoria.  Hockman tem aspectos masculinos e femininos e é uma antecipação da dualidade fundamental da biologia humana, macho e fêmea. Assim como o arquétipo dual de Iansã que é a menos feminina das Yabas.

Outro ponto que pode confirmar a relação de Iansã com Hockmah é que dentro da Tradição Ocidental dos Mistérios, como aponta Crowley, está associado ás deidades que regem os céus, a exemplo da deusa egípcia Nuit, a deusa estrela, assim como o domínio das deusas virgens como Atenas, a deusa grega da sabedoria que não nasceu do útero de uma deusa, mas da cabeça de Zeus, seu pai. Atenas, a sabedoria, é resultado do pensamento de Zeus, que representa sefirah Keter (coroa). Ela surge totalmente armada e é também uma guerreira feroz, assim como Iansã, que se diga de passagem é associada á essas divindades por alguns autores, a exemplo da obra Deus, Deuses, Divindades e anjos de Alexandre Cumino, o que dar lógica ao raciocínio aqui desenvolvido.

Iançã emanação divina de D`us, o Criador, está presente no Cosmo e na Terra em sua forma dual, na condução de todo tipo de criação não há forma nem substância, mas as energias começam a interagir entre si. Essa interação é o impulso criador de Iançã, desse impulso surgiu o cosmo, por exemplo...

Hoje, dia 4 de dezembro, faço minha homenagem analítica a essa “Criatriz” que nos impulsiona a mudança, esgota-nos de nossas tolices e nos direciona ao caminho da evolução, aquele que não ferirá nossa essência divina, cortando todos os tipos de males, doa a quem doer, em todos os campos, do amor á política, da espiritualidade á matéria, resistir a essa força transformadora é só prolongar o sofrimento. 

Refletir sobre Ela de forma imparcial pra mim ainda é um desafio, assim como um filho ao falar de sua mãe natural ou de criação, afinal Iansã é meu ori de frente, meu “signo solar”, meu escudo e ponto de equilíbrio desde quando era apenas um feto no útero de minha mãe. Não á toa, antes de nascer no nono mês, minha mãe ao abrir geladeira “acidentalmente” levou um choque elétrico, ainda sim, nasci sem trauma nenhum. Isso pode não dizer nada, mas de forma pessoal e transcendental isso diz alguma coisa a respeito desse Orixá e sua relação com seus filhos. Além de não ser do seu “feitio” passar muito a mão na cabeçinha das suas “crias”.

A homenagem de hoje dedico, em especial, á todos os “filhos e filhas” de Oiá que possam conseguir superar seus desafios,metas, medos ou traumas, deixar-se conduzir pela mudança e coragem no combate pessoal guiados pela sabedoria transformadora, recriando-se e nos recarregando com suas descargas elétricas nos parindo constantemente, sejamos esse impulso criador que renasce e se modifica, cortando o que não nos serve mais.  

Do Oriente á maio de 1968 nos muros do Ocidente que se diz sabiamente é “mudando a si mesmo que se revoluciona o mundo”. Sejamos revolucionários legítimos da alma até último fio de cabelo.

Epa hey, Oiá!

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